domingo, 26 de fevereiro de 2012

Respira outra vez o mundo

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Respira outra vez o mundo
chora águas pesadas de poeira
desde lajes altas da cidade
até o baobá solitário do morro acimentado
e a lavoura de café é seca nessa parte do ano
sementes e aromas transportados pelo atlântico
vida e sonhos desenhados nas cores improvisadas
desmontados nos blocos fracos da umidade


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Respira outra vez o mundo
nasce o sol quente nas vidraças coloridas
cheios de adesivos centenários desbotados
ilumina a piscina no asfalto lavado
crianças vestidas jogam pelada
e suas peles se misturam com as cores da lama
Corre o choro diarréico pelos córregos estreitos
abertos a céu fechado brota árvores nas suas bordas
vidas e culturas se alimentam de suas hortas
o pranto encontra as artérias entupidas do rio que corta a cidade


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Respira outra vez o mundo
nasce em flor e vapor a chuva ácida que lavou as casas
morros, ruas, avenidas, prédios, viadutos
ainda sujos de nojo, corrupção, desumanização
em alimento vence o infortúnio na pele da terra
os pedaços andantes dos seres ambulantes
sustentando força das ideias e dos amores
crescem, criam, sonham, lutam, ganham
pensam que plantam quando jogam a bituca na calçada
sonham que colhem o que compram no supermercado
com o seu dinheiro, não roubado
já foi sonegado em demasia
impostos, sossego, tempo de alegria
agora não quer mais pensar, só dormir para o outro dia
que respira mais uma vez a sua vida.

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